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A criminalidade do tráfico no RJ não é somente caso de polícia

Sabido é que as Polícias Militares (PPMM) são forças auxiliares reserva do Exército, assim como deve funcionar estruturalmente à imagem e semelhança dos verdes-olivas. Vinha sendo assim até que o regime militar se fez presente por absoluta necessidade. Porém, não se sabe por que razão mais profunda, o Exército determinou que as PPMM fossem para as ruas e logradouros policiar, tornando as corporações militares estaduais brasileiras, antes aquarteladas, uma polícia administrativa preventiva, ficando a repressão como exceção à regra na nova missão. Antes disso, as Polícias Civis cuidavam do patrulhamento, o que fazia dela uma “polícia completa”, ou seja, administrativa e judiciária. Porém, a restruturação não cuidou de modificar o formato das PPMM. Elas continuaram estruturalmente modeladas em batalhões, companhias e pelotões, com seus estados-maiores e tudo mais que a União exigia e ainda exige (vide Art. 22, caput, Inciso XI da CRFB).

Traduzindo o tema, não houve planejamento organizacional que pudesse tornar as PPMM um formato que atendesse à nova função, contrariando a lógica estrutural de Louis Sullivan: “A forma segue a função”. Novamente traduzindo, entenda-se “forma” como estrutura e “função” como objetivo, algo fácil de mentalizar, até mesmo comparando o conceito com o corpo humano, bastando exemplificar que se o indivíduo nascer com o coração no lugar do fígado, nem mesmo verá a luz. Ocorre o mesmo na vida cotidiana com todas as coisas em formato compatível com seus objetivos. Ou seja, não houve nenhum desenho organizacional destinado ao novo e grande objetivo das PPMM como polícias administrativas, apenas se trocou meia dúzia por seis, tal como haveria de ser, em tempos mais recentes, a fusão entre a GB e o RJ: sem planejamento estratégico, tudo feito no muque.

O resultado disso no novo RJ foi tão desastroso que hoje o que deveria ser um Estado melhor que São Paulo não passa de um monturo sem definição e cheio de improvisos na segurança pública. Enfim, intramuros, as Polícias Militares daqui do RJ foram unidas “a laço” ou “a pau e corda”, como antes se costumava dizer em relação aos soldados arrastados à força para vestir a farda de PM. Pior ainda no caso da PMEG, formada com os “restos mortais” da PMDF, que se deslocou para Brasília. Eis aí o cenário da PMERJ que resultou de separações e uniões forçadas de PMEG e PMRJ, sem planejamento estratégico, e mais como fruto de idiossincrasias de quem mandava mais: O Exército Brasileiro.

Claro que tudo isso gerou um processo degenerativo, compensado de quando em quando ou de longe e longe com efetivos novos e indiferentes ao passado. Ocorre que o passado não passou tão rapidamente assim, e quem mandava mais foi improvisando, enquanto se via atropelado pelos acontecimentos. Como “a vida militar exige poucas ideias”, já dizia Balzac, a nova PMERJ cuidou de mandar embora os já inativados e foi renovando o efetivo com novos soldados de “polícia administrativa”, sem que ninguém entendesse bem o significado conceitual e prático da nova moda de policiar de corporações afeitas aos afazeres intramuros, organizando-se do lado de fora como se o RJ fosse não mais que um mapa a ser traçado e subdividido em áreas, subáreas, setores, subsetores e roteiros, tudo dependente bem mais da capacidade de regeneração do que da necessidade planejada a alterar o que antes se via como tropa no seu mais anacrônico conceito de defesa interna e defesa territorial. Mas os tempos agora são outros…

A população inflou, as favelas se ampliaram deveras, a pobreza, a indigência e a miséria determinaram a péssima qualidade de vida dessas gentes simples, que buscavam tudo e nada encontraram, apenas mudaram de lugar sem escapar da tal “linha de pobreza”. São hoje milhares, quiçá milhões de famílias vivendo amontoadas em morros e manguezais aterrados no entorno da baía de Guanabara. E veio o tráfico de drogas a ocupar tudo, no início com certo romantismo exaltado em canções várias de autoria de compositores do asfalto e das comunidades, tornando ou tentando tornar essas “comunidades orgânicas” em glamorosos quintais do asfalto mais abastado, o que denominamos “sociedade organizada”. Ora!…

Hoje, há os narcoguerrilheiros em quantidades absurdas, armados com fuzis de guerra e comercializando drogas de montão para atender às demandas, que crescem em progressão geométrica, tais e quais os narcoguerrilheiros, neologismo que veio para ficar. De modo que há “dois brasis” no RJ: o das comunidades e o da sociedade, cenário já definido pela Ciência Política como “orgânicos” e “formais”. Se fôssemos desenhar, teríamos dois edifícios, um ombreando o outro, porém interagindo por meio dos serviços braçais parcamente remunerados: de um lado, o orgânico (“pobre, indigente e miserável”, ou, como inventaram recentemente por vergonha: os “abaixo da linha de pobreza”), e, do outro lado, o “formal” (cidadãos que se livraram, por enquanto, dos dissabores, sendo certo que alguns mudam de lado num processo seletivo típico do defeituoso e insubstituível capitalismo, porque o restante – socialismo e comunismo –  é ainda pior).

Eis, finalmente, o cenário real de hoje, com destaque para a Região Metropolitana do Grande Rio, que vivencia o que nos manuais das PPMM, especialmente os da PMERJ, assim traduzem a nova missão, no mais ou no menos, bastando aqui desenhar a atual realidade num conceito simples de “Medidas Operativas”: “medidas de caráter militar adotadas pelo Governo Federal, que visam a neutralizar as ações do inimigo interno, já identificado na fase da Grave Perturbação da Ordem. A situação a enfrentar é a luta interna.” (Bases Doutrinárias Para Emprego da PMERJ – 1983).

Esta “Perturbação da Ordem” não é “Pública”; esta “ordem” também não o é; é “interna”; portanto, está além da capacidade da PMERJ solucioná-la, o que nos remete às Forças Armadas (FFAA), e sua destinação anotada no Art. 142 da Carta Magna: […, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer um destes, da lei e da ordem.” (Grifo meu).

Difícil tem sido e continua sendo um governante estadual admitir tal situação, que não se resolve com “Medidas Preventivas ou Repressivas”, mas com “Medidas Operativas”. Em contrário, todos eles, desde que Brizola chegou ao poder no RJ em conluio com o CV, como denuncia, não eu, mas Carlos Amorim, jornalista que foi Diretor de Eventos Especiais do Sistema Globo, no seu clássico “Comando Vermelho – A História Secreta do Crime Organizado” – Ed. Record. Ele, sim, fez questão de iniciar o seu texto afirmando que “não se trata de ficção, mas fruto de doze anos de pesquisa”. Eu concordo com ele. Mas, e agora?…

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