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A CRIMINALIDADE DO TRÁFICO NO RJ NÃO É SOMENTE CASO DE POLÍCIA ESTADUAL

Sabido é que as Polícias Militares (PPMM) são Forças Auxiliares Reserva do Exército Brasileiro, obrigando-se ou sendo obrigada a funcionar estruturalmente à imagem e semelhança da estrutura verde-oliva. Vinha assim até 1964, quando então o regime militar se fez presente por absoluta necessidade. Porém, não se sabe por que razão mais profunda, o EB determinou que as PPMM fossem para as ruas e logradouros policiar, tornando as corporações militares estaduais brasileiras, antes aquarteladas, uma polícia administrativa preventiva, ficando a repressão como exceção à regra da nova missão. Antes disso, as Polícias Civis cuidavam do patrulhamento, o que fazia dela uma “polícia completa”, ou seja, administrativa e judiciária. Porém, a restruturação não cuidou de modificar o formato das PPMM. Elas continuaram modeladas em regimentos, batalhões, companhias e pelotões, com seus estados-maiores e tudo mais que a União exigia e ainda exige em termos estruturais (vide Art. 22, caput, Inciso XI da CRFB). Na verdade, algo compreensível por ser facilitador da interface com a Força Militar Federal.

Traduzindo o tema, porém, não houve planejamento organizacional que pudesse tornar as PPMM fracionadas num formato que atendesse à nova função, mais individualizada como policiais e menos de tropa militar quartelada, contrariando a lógica estrutural de Louis Sullivan: “A forma segue a função” (entenda-se “forma” como estrutura e “função” como objetivo).

Ora bem, algo fácil de mentalizar, todavia difícil de operacionalizar de um dia para outro. Enfim, comparando o conceito com o corpo humano, basta exemplificar: se o indivíduo nascer com o coração no lugar do fígado, nem mesmo verá a luz. Ocorre o mesmo na vida cotidiana com todas as coisas em formato compatível com seus objetivos. Ou seja, não houve nenhum desenho organizacional destinado ao novo e grande objetivo das PPMM como polícias administrativas, apenas se trocou meia dúzia por seis, tal como haveria de ser, em tempos mais recentes, a transferência da capital federal para Brasília e a posterior fusão entre a GB e o RJ: sem planejamento estratégico, tudo a toque de caixa manu militari.

O resultado disso no novo RJ foi tão desastroso que hoje o que deveria ser um Estado melhor que São Paulo (era a bem-intencionada ideia do Presidente Geisel) não passa de um monturo sem definição, cheio de improvisos na segurança pública e em todo o resto. Enfim, intramuros, as Polícias Militares daqui do RJ foram unidas “a laço” ou “a pau e corda”, como antes se costumava dizer em relação aos soldados arrastados à força para vestir a farda de PM. Pior ainda no caso da PMEG, formada com os “restos mortais” da PMDF, que se deslocou para Brasília e boa parte retornou à origem. Eis o cenário estrutural da PMERJ que resultou de separações e uniões forçadas de PMEG e PMRJ, sem planejamento, mais como fruto de idiossincrasias de quem mandava mais: os mandatários do Exército Brasileiro.

Claro que tudo isso gerou um processo degenerativo, compensado de quando em quando ou de longe e longe com efetivos novos e indiferentes ao passado. Ocorre que o passado não passou tão rapidamente assim, e quem mandava mais foi improvisando enquanto se via atropelado pelos novos acontecimentos. Mas como “a vida militar exige poucas ideias”, já dizia Balzac, a nova PMERJ cuidou de mandar embora os já inativados e foi renovando o efetivo com novos oficiais, graduados e soldados de “polícia administrativa”, sem que ninguém entendesse bem o significado conceitual e prático dessa nova moda de policiar a partir de corporações afeitas aos afazeres intramuros militares, organizando-se do lado de fora como se o RJ fosse não mais que um mapa a ser traçado e subdividido em áreas, subáreas, setores, subsetores e roteiros, tudo dependente bem mais da capacidade de regeneração do que da necessidade planejada a alterar o que antes se via como tropa no seu mais anacrônico conceito de defesa interna e defesa territorial. Mas os tempos agora eram outros: faltava dinheiro ao novo RJ e a União ignorou suas responsabilidades históricas, como sei viu em Bonn e São Petersburgo (respectivamente Berlim (Alemanha) e Moscou (Rússia). Essas cidades foram federalizadas e não sentiram o peso do desastre econômico-financeiro que se viu no Brasil.

A população das favelas ampliaram-se deveras, a pobreza, a indigência e a miséria determinaram a péssima qualidade de vida dessas gentes simples, que buscaram tudo e nada encontraram, apenas mudaram de lugar sem escapar da tal “linha de pobreza”. São hoje milhares, quiçá milhões de famílias vivendo amontoadas em morros e manguezais aterrados no entorno da baía de Guanabara. E veio o tráfico de drogas a ocupar tudo, no início com certo romantismo exaltado em canções várias de autoria de compositores do asfalto e das comunidades, tornando ou tentando tornar essas “comunidades orgânicas” em glamorosos quintais do asfalto mais abastado, o que denominamos “sociedade organizada”. Ora!…

Hoje, há os narcoguerrilheiros e milícias em quantidades absurdas, armados com fuzis de guerra e comercializando drogas de montão para atender às demandas, que crescem em progressão geométrica, tais e quais os narcoguerrilheiros, neologismo que veio para ficar. De modo que há “dois brasis” no RJ: o das comunidades e o da sociedade, cenário já definido pela Ciência Política como “orgânicos” e “formais”. Se fôssemos desenhar, teríamos dois edifícios, um ombreando o outro, porém interagindo por meio dos serviços braçais parcamente remunerados: de um lado, o orgânico (“pobre, indigente e miserável”, ou, como inventaram recentemente por vergonha: os “abaixo da linha de pobreza”), e, do outro lado, o “formal” (cidadãos que se livraram, por enquanto, dos dissabores, sendo certo que alguns mudam de lado num processo seletivo típico do defeituoso e insubstituível capitalismo, porque o restante – socialismo e comunismo –  é ainda pior).

Eis, finalmente, o cenário real de hoje, com destaque para a Região Metropolitana do Grande Rio, que vivencia o que nos manuais das PPMM, especialmente os da PMERJ, assim traduzem a nova missão, no mais ou no menos, bastando aqui desenhar a atual realidade num conceito simples de “Medidas Operativas”: “medidas de caráter militar adotadas pelo Governo Federal, que visam a neutralizar as ações do inimigo interno, já identificado na fase da Grave Perturbação da Ordem. A situação a enfrentar é a luta interna.” (Bases Doutrinárias Para Emprego da PMERJ – 1983).

Essa “Perturbação da Ordem” não é “Pública”, pois essa “ordem” também não o é; é “interna”; portanto, está além da capacidade de a PMERJ solucioná-la, o que nos remete às Forças Armadas (FFAA), e sua destinação anotada no Art. 142 da Carta Magna: “[…] e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer um destes, da lei e da ordem.” (grifo meu). Por conseguinte, difícil tem sido e continua sendo a um governante estadual admitir tal situação de exceção legal a demandar ação coercitiva além da lei, já que essa criminalidade volumosa e perigosa não se resolve com “Medidas Preventivas ou Repressivas” via BOPE ou BPChoque da PMERJ, ou a CORE da PCERJ, mas com “Medidas Operativas” das FFAA sem descartar essas forças de segurança estaduais. Feia a coisa, mas os governantes estaduais negam a realidade desde que Brizola chegou ao poder no RJ, em conluio com o CV, travando a polícia mediante ordem direta, como denuncia, não eu, mas Carlos Amorim, jornalista que foi Diretor de Eventos Especiais do Sistema Globo, no seu clássico “Comando Vermelho – A História Secreta do Crime Organizado” – Ed. Record. Ele, sim, fez questão de iniciar o seu texto afirmando que “não se trata de ficção, mas fruto de doze anos de pesquisa”. Eu concordo com ele, o conluio houve, a omissão policial aconteceu e a turbulência ambiental efervesceu ante a acelerada progressão da criminalidade. Mas, e agora?… Que fazer?…

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